Crítica - Aquarius



Por Esdras Castiliano

Aquarius é um grito. Um grito de pertencimento ao espaço e resistência. Um grito de ocupação do que vem sendo tomado de nós há 500 anos. Aquarius cumpre com maestria seu exercício sobre os afetos, poderia facilmente ter sido chamado de "Summer Sleep", em referência ao cineasta turco Nuri Bilge Ceylan.

Kleber Mendonça Filho, em seu segundo filme, trabalha um puro estudo de personagem, traz sua própria estética e linguagem - mais uma vez o filme é dividido em capítulos: O cabelo de Clara, O amor de Clara e O câncer de Clara. Aqui, as fotos dos engenhos e latifundiários deram lugar às fotos da Avenida Boa Viagem e dos prédios, Jackie Brown deu lugar a Barry Lyndon, as batidas ritmadas deram lugar a uma trilha sonora mais suave e nostálgica, o corte brusco dos prédios envolvendo as garrafas deu lugar a um frame sem as famigeradas "Torres Gêmeas do Recife", as bombas deram lugar aos cupins. Kleber também continua com suas clássicas alfinetadas nas elites burguesas, acidez presente desde seus curtas e ainda mais explícitas no aclamado O Som ao Redor, seu primeiro longa.

Trazendo em seu corpo, seu cabelo e seu olhar distorcido, as marcas do seu tempo, Sonia Braga entrega uma interpretação sublime e marcante, digna de todos os elogios possíveis. A fim de retomar o antigo, sem abandonar o novo, Sonia é a atriz perfeita para o papel, assim como nenhum outro ator cairia tão bem na metáfora criada por Michael Keaton em "Birdman". Clara é uma personagem complexa, suas marcas nem sempre estão expostas, recordar faz parte de seu viver diário e preservar isso é seu ato político, seu modo de não andar morrendo pela vida. A canção "Hoje" de Taiguara é a canção de Clara, foi escrita para ela, diretamente do passado. Clara é a fossa, a fome, a flor, o fim do mundo.

Aquarius, assim como "Winter Sleep", que venceu a Palma de Ouro dois anos atrás, tem seu lugar de prestígio na sétima arte. Aquarius acaba sendo um grito contra os "cidadãos de bem" que se dizem fartos de caráter, quando na verdade são vazios. Também, um grito contra os cupins da sociedade. Mas, sobretudo, um grito sobre as relações humanas degradadas.

Classificação Indicativa - Fica aqui o nosso repúdio contra a classificação indicativa de 18 anos. Filmes como Bruna Surfistinha foi destinado para maiores de 16 anos.

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