A saudação do Distrito 8 para o tordo. Divulgação/Lionsgate |
Jogos Vorazes se apresenta como a franquia teen mais amadurecida da cultura pop atual. Seu público-alvo cresceu, assim como sua dramaticidade, violência e política ganharam mais força nesse terceiro e penúltimo filme da saga, A Esperança - Parte 1, que foca na manipulação da propaganda como instrumento de levante nos Distritos, provocada pelo lendário Distrito 13. Para isso, Katniss Everdeen (Jennifer Lawrence) precisa assumir seu lugar como símbolo da revolução contra o totalitarismo da Capital. É na melhor frase do filme, proferida por Effie (Elizabeth Banks), que vem o recado: “Coisas antigas podem voltar à moda. Como a democracia.”
A exuberância das arenas e da ostentação cheia de cores do governo a la “Pão e circo” da Era Romana, deram lugar agora à uma fotografia sombria e cinza, que representa os efeitos da guerra e o sentido de igualdade do Distrito 13. Um lugar sóbrio, sem privilégios e militarizado (assim como os regimes socialistas), comandado pela Presidente Alma Coin (Julianne Moore). No meio disso tudo, Katniss ainda se encontra traumatizada depois do Massacre Quaternário (Jogos Vorazes: Em Chamas) e preocupada em resgatar Peeta (Josh Hutcherson), que ficou refém na Capital junto com os outros vitoriosos, Johanna (Jena Malone) e Annie (Stef Dawson).
Podemos dizer que Em Chamas é o filme mais cheio de glamour e ação, mas é em A Esperança - Parte 1, que temos um roteiro mais preciso e focado no psicológico dos personagens. A montagem, com cortes simples, valoriza isso e a adaptação é a mais fiel à narrativa de Suzanne Collins, com falas fundamentais sendo citadas, como a de Katniss afirmando para si o que é verdadeiro (uma tentativa de se manter lúcida). São até percebidas diferenças entre o livro, como na economia de personagens e nas atitudes de Katniss e de outra pessoa (omitido por ser spoiler), mas acredito ser uma estratégia para as revelações virem à tona no último filme. É importante lembrar que a Capital também manipula a mídia, mas para cessar os confrontos. Caesar Flickerman (Stanley Tucci) entrevista Peeta, que prega um discurso de paz. Em outra cena, Snow (Donald Sutherland) troca a palavra "rebeldes" por "radicais" em seu discurso. Sentidos diferentes para se referir ao mesmo povo, pois enquanto uma passa a impressão de incentivo, a outra condena a ação.
Os movimentos tremidos da câmera, dão a sensação de urgência nos poucos momentos de ação do filme, como em toda a excelente sequência do Distrito 8. Temos também o resgate de Peeta e dos vitoriosos sendo intercalado com o discurso de Finnick (Sam Claflin), as batalhas entre rebeldes e pacificadores, Katniss brincando com o gato e tendo um momento de epifania e o encontro entre Peeta e Katniss como os principais destaques. Mas o ápice mesmo foi a sequência “The Hanging Tree”. Faltou mais detalhes sobre o quanto a música é significativa nos livros, mas só nesse filme ela é apresentada ao público, na voz meio rouca de Jennifer Lawrence (com melodia combinada ao indie da trilha sonora), nessa belo momento que é finalizado com os rebeldes do Distrito 5 cantando enquanto avançam para destruir a represa da Capital.
Sobre o elenco, não tem como tirar os olhos de Jennifer Lawrence (pela atuação e pela peruca). Mais familiarizada do que nunca com a personagem, Lawrence nos passa uma entrega total ao conflito do tordo, representando a jovem que é constantemente obrigada a ser adulta e carregar traumas, mas que ainda não se perdeu de si mesma. Sua heroína é forte e protetora, mas também é humana, egoísta e incoerente. Donald Sutherland, Phillip Seymour Hoffman e Julianne Moore foram pontuais com seus personagens, assim como Josh Hutcherson, que rendeu muito mais comparado aos outros filmes da saga (mesmo tendo uma participação menor) e não só pelo emagrecimento. O ator amadureceu o personagem e podemos esperar um Peeta mais evoluído na parte 2. Os destaques no alívio cômico novamente vão para Woody Harrelson e Elizabeth Banks, mas com participações bem reduzidas e em um tom mais dramático.
Liam Hemsworth ganha mais notoriedade, mas ainda se encontra apagado comparado aos outros. Entre os novatos, Natalie Dormer (Game of Thrones) chega para somar. Na pele da diretora Cressida, ela é quem comanda a equipe de filmagem que segue a garota-propaganda dos rebeldes. Katniss é travada em estúdio, então é preciso colocá-la no meio do conflito para que expresse suas emoções de maneira mais natural. Qualquer gesto, por mais que seja corriqueiro e banal, ganha repercussão. A crítica é apresentada desde de 1984, de George Orwell, mas continua atual. A sociedade é midiática e os jogos vorazes, em menor escala, circulam de "maneira inofensiva" todos os dias.
Enquanto preparava essa review, li uma notícia sobre jovens da Tailândia que foram detidos pela polícia ao serem vistos fazendo o gesto com os três dedos no alto (a saudação dos rebeldes no filme). Eles planejavam um protesto no dia da estreia de A esperança - Parte 1, contra o golpe militar que foi instaurado no país. Por conta disso, várias redes de cinema na Tailândia cancelaram a exibição por medo de retaliações. Percebo assim o alcance que um filme desse nível pode ter e lembro ao mesmo tempo da neta do Presidente Snow, que admira Katniss imitando sua trança, mas a desfaz quando presencia o discurso do avó para toda a Panem, sobre qualquer referência ao tordo ser retaliada. Lembro também da cena em que Katniss e Gale (Liam Hemsworth) vão caçar na floresta do Distrito 13 e ela observa a sua presa. Para no instante que percebe que o animal não a teme, pois nunca se sentiu ameaçado por ninguém dali.
Franquias tem como principal missão divertir o grande público e Jogos Vorazes: A Esperança - Parte 1, pode frustrar quem busca apenas um entretenimento de fácil digestão. O triângulo amoroso é secundário comparado à outros filmes do gênero, então, o ideal é você olhar além e perceber que tanto o filme como o livro quer gerar um debate entre jovens e adultos. Essa parte I preparou bem o clímax da conclusão (que chega aos cinemas no final de 2015), sendo mais gráfica que os antecessores e tomando salas de cinema no mundo todo de maneira tão voraz quanto o próprio título. Mas essa discussão fica para outro post.
Franquias tem como principal missão divertir o grande público e Jogos Vorazes: A Esperança - Parte 1, pode frustrar quem busca apenas um entretenimento de fácil digestão. O triângulo amoroso é secundário comparado à outros filmes do gênero, então, o ideal é você olhar além e perceber que tanto o filme como o livro quer gerar um debate entre jovens e adultos. Essa parte I preparou bem o clímax da conclusão (que chega aos cinemas no final de 2015), sendo mais gráfica que os antecessores e tomando salas de cinema no mundo todo de maneira tão voraz quanto o próprio título. Mas essa discussão fica para outro post.
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